23 novembro 2011

...Das Lágrimas


Hoje te vi chorar.
Não foi a primeira vez, nem segunda. Mas hoje tuas lágrimas falavam mais que tua boca. Normalmente teus olhos falam mais que a boca. E te ver ali, largada no banco, pendurando-se num fio de certeza que de tão fino só não partia-se em dois porque tu ainda respirava e por outros motivos que só tu podes dizer.
Tua angústia berrava pelos poros da tua pele, misturava-se ao suor e a poeira da estrada que repousava sobre ti. O sol firme no céu e eu desejando que tu ficasse firme também. Não tinha vento e o não ter vento me fazia ouvir os teus batimentos cardíacos lentos, indesejosos dessa vida que te obriga a planejar mundos e fundos até para teus netos que ainda nem existem. Teus ombros caídos, o peso do certo e errado sobre eles. O certo e o errado nas tuas costas, longe do alcance dos teus olhos, impossibilitando-te de escolher um dos dois.
E eu ali, do lado, calada a mordiscar uma maçã sem gosto algum, sem fome alguma. Era meu pretexto por não saber o que falar. Por saber que estava no mesmo barco, no mesmo carro, no mesmo avião, na mesma garupa, no mesmo chão... E ainda assim não saber o que falar.
Joguei metade da maçã fora.
Avancei sobre ti e comecei a arrancar tuas angústias, elas esperneavam na minha mão. Joguei-as no chão e o sol encarregou-se de queimá-las. Então teus batimentos voltaram a pulsar uma melodia linda, começou a ventar e de ti emanava uma bela canção...
Pisquei.
Estavámos bebericando café.
Pisquei.
Você estava flutuando em uma piscina. Tive curiosidade em saber qual era a sensação.
Pisquei.
As angústias esperneavam no chão.
Pisquei.
O vento passava por ti fazendo música como numa flauta doce.
Pisquei.
Estava no chão. Respirando fraquinho. Pensando tanto que parecia estar em transe.
Pisquei.
Desejei realmente poder livrar-te de tudo que te faz chorar. Logo eu, que não chego a ser nada, desejei.




P.s.: pra mim. Do meu Oskar.

8 comentários:

Oskar disse...

Um dia ainda desenvolvo um super poder e vou poder queimar angústias ao sol.
Mas vou deixar só algumas, bem pouquinhas, pra poder você reconhecer o alívio.

<3

Bárbara disse...

Muito bom. Eu ando numa fase que procuro até o luar para tentar me desfazer dos sofrimentos.

Paola Rodrigues disse...

Encantador...Realmente doce.

Daniel Lira disse...

Lindo, não tenho mais muito o que dizer. Essa habilidade de tirar as palavras da minha boca são de poucos, e te parabenizo por ela. Talvez esteja sem palavras poque me vejo em seu texto, sua personagem sou eu, e eu sei que por mais que queiramos nos livrar a angústia está lá. Lindo, repito enfim para que essa seja a lembrança final, não minha plangência. Lindo, lindo.

Juliana Cimeno disse...

The pain from the ones we love hurt deeper than our own...

Priscila disse...

Lindo, lindo, LINDO!

Nathy. disse...

É, essas sensações todas geradas pela leitura desse que foi o e-mail mais lindo do mundo são todas mérito da parceira de blog mais querida da face da terra.

Um brinde à Ágda.

Puma Azul disse...

Lindo, Ágda!
Lindo e verdadeiro. A gente se sente como se um anjo arrancasse as angústias do nosso peito e as fizesse torrar ao sol.
Obrigada.