26 dezembro 2012

Admirável Mundo Novo

Eu respirava tão fundo e bem lentamente. Desejava que meu pulmão sentisse aquele novo mundo que estava conhecendo. Tocava tudo com todo o cuidado, sentindo cada partícula, imaginando como teria sido todo o processo de criação. As folhas tinham um tom diferente. A vida pulsava delas. De todas elas que estavam no pequeno bosque. Podia ouvi-las também. A Terra é a nossa mãe. O vento é a nossa vida.
Não sentia apenas o calor humano, eu os via sair através de sua pele, via pra onde iam, via suas cores, sentia seus cheiros. Alguns lembravam infância e era ali que eu mais gostava de ficar. Cheiro de tangerina, de terra molhada, de leite com bolacha, de chá de hortelã. As cores eram lindas, lindas. Os cheiros muito agradáveis. O mundo estava ali pra mim, como sempre estivera. Mas o terceiro olho só fora aberto no meu aniversário. Um presente. Um dos melhores presentes.
Entender como cada peça realmente tinha o seu lugar, que tudo era apenas questão de tempo. Ver que o essencial é respirar, fechar os olhos, sentir o calor e deixar que ele guie. Nesse dia tive as melhores surpresas, as melhores sensações, os melhores abraços. Amei o mundo. Toda a tristeza fora expurgada ao abrir o terceiro olho. Poderia voar se quisesse. Eu poderia estar voando e nem perceberia. Estava leve, sem preocupações, sem pensamentos. Eu apenas sentia. Apenas amava.
Sendo algo totalmente desprovido de físico. Não era meu corpo que amava e sim meu espírito. Deixei que pelo menos naquele dia ele me guiasse. Respirar era a única coisa que eu tentava lembrar de fazer. Respirar era algo muito bom. Sentir o ar entrando, preenchendo tudo, clareando pensamentos.
A mesma sensação por mais de oito horas seguidas. O efeito nas luzes, a energia das pessoas, das flores, arbustos, trepadeiras-elefante, os sons. Tudo era novo. Por muitas vezes cheguei a pensar que aquele corpo não era meu. Que meu espírito poderia muito bem viver livre.
Nos dias seguintes tive de voltar aos poucos para meu corpo e até ele estava mais leve, mais puro. Ao abrir o terceiro olho ele havia sido purificado. Era tão cansativo voltar. Era cansativo aquela rotina. Mas sentir a vida pulsar não existia nada que pudesse comparar.
Essa paz que me preenche e protege. Esse tipo de paz você só tem quando se entrega. E essa paz emana de mim para quem esteja por perto.
Por todo esse ano eu buscava ânimo, quando só precisava dessa paz. Depois disso o caminho parece mais fácil, os amigos passam mais tempo presentes. Nossos caminhos permanecem lado a lado, encruzilhados, enrolados, embolados e pouco me importo com isso.
Eu só respiro, mas não respiro só.



Informações adicionais: o título desse post refere-se ao livro homônimo de Aldous Huxley, clique aqui para mais informações. Leia e assista ao filme. Merci

07 outubro 2012

[crônica] Azia

O despertador do vizinho era tão bom que eu podia ouvi-lo mesmo havendo uma distância de mais ou menos 8 metros e 3 paredes no meio. Ele tocava exatamente às 5:05 da ma-nhã. Nun-ca descobri o que meu vizinho fazia a essa hora, estava ocupado de-ma-is imaginando di-ver-sos modos de invadir a casa dele e dar um sumiço no maldito despertador.
Na-da mais restava além de levantar e fazer meu café.
For-te, a-mar-go.
Pouca gente gostava do meu café. Pouca gente gostava de mim. Procurava não me importar. Mas no fundo é cla-ro que me importava. E estou aqui, escrevendo e imaginando que minha voz seja igual a do Wagner Moura. Sabe quando ele narra os pensamentos em algum filme e faz a-que-las pausas na leitura? Pois é, estou escrevendo e len-do assim. A voz do Wagner Moura e a aparência dele. Por que não? Então me faz o favor de ler com a voz do Wagner Moura na sua cabeça. Talvez melhore a qualidade dessa crônica.
Pensei aqui em infinitas profissões que poderiam fazer você ter pe-na de mim, mas não consegui escolher uma. Então digamos que eu passe a manhã numa mesa, vários papéis em cima e um chefe barrigudo que solta piadas escrotas e paga meu salário atrasado. Imagine tu-do isso em câmera lenta.
A mesa velha, papéis caindo ao chão, mos-cas na careca do meu chefe, o botão de-sa-bo-to-a-do jus-ta-men-te no umbigo dele, o ven-ti-la-dor de teto que quase não gira e o sol fer-ven-do lá fora.
Agora volte a realidade comigo, há uma velha cafeteira na sala. Meu único conforto ali.
O café não é forte e nem amargo. Não tenho grana pra manter café forte e amargo em dois lugares.
Da janela dá pra ouvir o trânsito caótico lá fora. Há um pano velho na janela e isso me faz lembrar Bernardo Soares. Pouca gente sabe quem é Bernardo Soares. Pouca gente sabe quem sou.
A hora do almoço não tem na-da de sa-gra-da na minha vida. Se eu tiver grana pra coxinha já vai ser algo maravilhoso.
Vez ou outra encontro algum amigo. Eu pago o café, ele os cigarros. Conversamos qualquer coisa pra encher a barriga de vento e logo o vento nos leva pra qualquer outro lugar. Pro-va-vel-men-te o segundo emprego. E tal-vez seja por isso o alto índice de desemprego em to-dos os lugares.
Há uma certa melhora. A cafeteira é mais moderna e só preciso me servir. O café es-tá sem-pre lá. 
For-te e doce.
Maria João diz: "De amargo já basta a vida, meu filho".
Du-as se-ma-nas de-po-is d. Maria João descobre que tem diabetes. O café continua forte, mas a-go-ra com Adocil. Perguntei a Maria José por que não usava Zero Cal (kal?) e ela respondeu que não gostava do Zé Wilker.
Eu tam-bém não gostava dele. Ah, A-que-les ó-cu-los coloridos durante as premiações do Oskar me irritavam ma-is que os comentários absurdos dele.
Prefiro Zé de Abreu, mas não sei dizer os motivos.
Todo mundo tem o seu Zé.
Só não desejo o Zé Pequeno pra nin-guém.
Minha cabeça a essas horas es-tá cheia de café, cálculos e ca-ra-mi-nho-las. Meu estômago distribui pon-ta-das e ao caminhar na rua imagino que a qual-quer ins-tan-te um filhotinho meigo de Alien vá sair pela minha barriga.
Ao sair do trabalho, um copinho de café na mão e o notebook nas costas, vou pra casa. Dobro a esquina e sou assaltado, es-fa-qui-a-do 23 vezes porque o cara havia assistido esse filme idiota e faltado todas as aulas de matemática do en-si-no fun-da-men-tal.
O café vaza pelo meu corpo. A população inteira da cidade chega até mim, menos o SAMU.
Men-ti-ra.
Na-da disso aconteceu.
Queria apenas deixar essa crítica ao SAMU, pois vale o mesmo que a Madonna condenar algo relacionado as Pussy Riot.
Começo a achar que Elton John tem razão sobre o que anda falando sobre ela.
A crônica termina por aqui. O cachê para a voz do Wagner Moura na cabeça não permite mais carácteres.
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Olá, olá.
O Good Times está de volta, mas ainda estamos de mudança. Eu e Nathy  temos ótimos planos e posts e zaz! Então paciência, gafanhotos!

15 agosto 2012

Our time para se renovar.


A nota de reforma do blog chegou (com quatro meses de atraso mas chegou).
A boa notícia é que estamos trabalhando pra limpar as teias de aranha daqui o mais rápido possível.

Em breve novidades.

09 abril 2012

Ve.me.dar Amor

A vontade que bate sempre naquelas horas em que o sol alcança determinado ângulo que lembra teu sorriso, essa vontade de ver teus olhos fechando-se ao formar aquele sorriso que é único pra cada um, o abraço de lado, com tua cabeça no meu ombro e assim o peso do mundo se esvai. E assim eu tenho paz. Só assim eu tenho paz.
A estrela cadente corta o céu, nossos dedos, olhos e corações voltados a ela e meu único desejo é sempre que aquele momento se repetisse tantas vezes quanto fosse possível. Podia ser impressão ou não, mas ali, naquelas madrugadas frias, nossos corações tinham um som só. E o só não existia entre a gente.
Agora eu fico aqui, debaixo dessa árvore sozinha. Lembrando do teu sorriso, dos teus olhos que agora devem estar marejados, tão cheios de lágrimas quanto os meus, e seu nariz deve estar com a ponta vermelha e então um sorriso tímido vai aparecer. E vem um vento, bem calmo, levanta a poeira e o sol lança aquela luz única, meio alaranjada, meio amarelada, meio avermelhada, meio Natascya. É uma luz, que esquenta, que envolve e que me tem feito falta.
Vem.
       .e
         .dar
               AMOR.


19 março 2012

Faltam meus amigos


Faltam meus amigos
as mãos dadas, as delicadas
o riso contido, as gargalhadas
as meias palavras
e os ditados francos

Faltam meus amigos
os passos longos e os curtos
os rostos suaves e os hirsutos
os grandes abraços
daqueles que afastam quebranto.

Faltam meus amigos
explêndidos, loucos, normais
os impacientes e os que escutam meus ais
Aqueles que tem por mim tamanho apreço.
Apreço de causar espanto
carinho que parece sem fim.


Por Alan Silva

06 fevereiro 2012

Boa parte de mim vai pra Espanha


O dia estava nascendo. Dava pra ver no horizonte. A vista era linda. Prédios antigos, as pessoas charmosamente vestidas à moda que o inverno ditava. Aquele clima estava pedindo uma visita a Ponte de Alcântara, mas o dinheiro para o aluguel da lambreta teria que esperar. O sol saía pra esquentar um pouquinho. Eu ria ao tentar lembrar do sol do meu país. Das luzes quentes, nas madrugadas quentes. E uma lágrima de saudade escorria e eu corria e escrevia sobre estar ali, sobre querer um afago familiar, uma cervejinha no domingo à tarde, o som do carro bem alto e o vento levando e lavando minha alma.
Mas uma caminhada a Guadalupe eu não evitaria. Lugar lindo e cheio de histórias. Eu torcia pra lembrar de todas elas e contar na roda de amigos. Roda, quadrado, triângulos e tantos círculos. Dá até tontura lembrar. Dá cansaço só de lembrar das ladeiras que tenho andado. Mas a paisagem faz esquecer rapidinho. Só não esqueço daquele monte de ninhos de gaivotas. Nunca tinha visto tantas juntas.

Um estalo, um canto do galo, o sol na janela.

As paredes verdes, a velha estante de livros, o criado-mudo que mesmo pintei, as revistas espalhadas no chão, o skate do meu irmão, os recortes e pôsteres nas parede, os adesivos na janela, o baú cheio de lençóis, o rádio da vovó tocando ao longe, o ventilador rangendo, os primeiros espirros matinais, algumas pecinhas de Lego jogadas pelo chão, roupas penduradas atrás da porta, sapatos jogados em qualquer canto, algum brinquedo do meu irmão caçula, aquele trequinho de proteção que nunca sei o nome pendurado na janela e o vento balançando-o.
Depois de um tempo, você passa a perceber que dá pra estar em dois lugares ao mesmo tempo. O único problema é que se uma parte de mim está na Espanha, eu deveria me sentir mais leve e não o contrário. Mas talvez, por ser o contrário, por sentir esse peso, signifique o real laço que existe entre a gente. E não é nem pra ter um talvez nessa história. É isso sim. Acabei de sentir o fio amarrado no meu tornozelo e faltando alguns pedaços do meu peito.
E isso faz todo sentindo quando te abraço.





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Hey, Nathy, ~ ainda ~ não é seu aniversário. Mas cá está, umas palavras pra você, que fez de 2011 um ano cheio de sol e cerveja pra mim. E 2012 também, claro.
É bem assim que quero me sentir enquanto tu se encontras nas terras hispânicas.

Amo você, Oskar.

25 janeiro 2012

Our house in paradise


De vez em quando tenho um desses dias em que algo muito bom fica programado. Cê sabe como é?
Desses dias em que você espera espera espera imagina espera espera até que
Chega.
Vinte e nove de Dezembro de dois mil e onze.
Só sabia que ia ter um mar molhando os pés e um céu azul clareando a cabeça.
E teve
amor
sorriso
abraço
E porque diabos essas palavras estão no singular?
Tiveram
amores
sorrisos
abraços
e em uma quantidade suficiente pra que ninguém quisesse mais voltar.
O apartamento vinte e nove acabou se tornando um palco.
As apresentações geralmente começavam as onze porque era a hora em que todos estavam sincronizados. Mesa feita. Todos em volta, sem que combinassem nada, sem que fosse hábito fazer isso em casa.
Se preocuparam tanto com a natureza dos mineirais quanto com o rock e pedais.
E perderam as estribeiras no primeiro mergulho naquele mar azul verde azul.
E perderam os celulares.
E esqueceram as havaianas.
E deixaram metade da cabeça lá.
Vamos cozinhar a multa pelos sorrisos até as três da manhã em banho maria, que tal? Mas, aproveite que já tá de pé e coloque a água do cuscuz pra esquentar, tá bem? Já tá na hora de ir a praia.
Não consigo te dizer o que mais marcou não, desculpa.
Foram ladeiras demais, supermercados demais, ônibus demais, e sol e música, e rolés e

v i d a.

Te prometi descrever o que eu vivi. Não consigo. Agora eu te digo o seguinte: só sente quem viveu.
Só sei que teve um céu molhando os pés e um mar zul clareando a cabeça.
E que tenho outro lar.
Apartamento vinte e nove, um dia eu volto, boy.


17 janeiro 2012

Cabeça de Vento


"E a cabeça foi passear.
Foi para um canto remoto de algum bosque pensar sobre as asas dos passarinhos.
Foi fazer diálogos imaginários.
- Como o dia está lindo.
- Concordo, meu bem.
Foi correr com algum animal na beira do rio.
Encontrou o pólen dentro de alguma flor. Sugou tudo e saio voando novamente.
Pensou em você, seja você quem for.
Imaginou futuros possíveis - e impossíveis.
Pensou em voar, pensou em chorar, pensou em evoluir.
Viu aplausos e vaias. Se atentou ao olhar, um pouco apaixonado, um pouco amargo.
Foi para um canto remoto no qual o medo mora. E lá era escuro.
Correu novamente, porque é só isso que se pode fazer. Correr dentro de si mesma.

E num estalo, a realidade."

02 janeiro 2012

Acabou Chorare

"Acabou chorare no meio do mundo.
Respirei eu fundo, foi-se tudo pra escanteio
.
Vi o sapo na lagoa, entre nessa que é boa."













O sol brigava com as folhas e as nuvens para chegar até nós. E ao conseguir, encontrava ainda as garrafas de suco e cerveja que amarramos nos galhos durante a noite toda, acompanhando o ritmo que íamos esvaziando-as. Era um espetáculo lindo de luzes, cores e sons sobre nós.
A cidade estava dormindo ainda. Dava pra ouvir o som do mar se arrebentando nas rochas, e a vontade de dormir sob a sombra, luzes e cores da nossa árvore era tão grande que quando ganhei cafuné da Cris fechei os olhos e apenas me permiti sentir o calor das luzes.
Sempre que eu me permitia sentir as luzes e o calor que delas emanava, lembrava do Oskar, que já tirava seu cochilo sobre a sombra da árvore há alguns minutos. A ideia de amarrar garrafas vazias nos galhos da árvore fora dele. Mas nenhum de nós tinha noção do quão lindo ficaria.
A Cris parara de fazer cafuné. Sinal de que estava tirando seu cochilo também. Abri novamente os olhos. O vento balançava os galhos fazendo as garrafas se tocarem e assim produziam sons quase mágicos. E talvez até fossem. Respirei fundo, e mais fundo outra vez. Às vezes eu tinha medo de espocar de tanta felicidade, como o Oskar costuma dizer.
Um ano havia passado desde que conheci e passei a conviver com todas aquelas pessoas deitadas sobre a sombra, luzes, cores e sons da nossa árvore. Às vezes nem parecia um ano. Às vezes pareciam vidas. E a ausência deles pareciam séculos.
Minha amizade com aquelas pessoas era algo impressionante. Era uma doação de amor sem medidas, sem interesses; era algo que eu nunca tinha provado na vida. Era algo que sempre me dava a impressão de estar em falta com eles. E eu realmente espero estar sempre em falta, porque essa falta só eles são capazes de preencher.