06 fevereiro 2012

Boa parte de mim vai pra Espanha


O dia estava nascendo. Dava pra ver no horizonte. A vista era linda. Prédios antigos, as pessoas charmosamente vestidas à moda que o inverno ditava. Aquele clima estava pedindo uma visita a Ponte de Alcântara, mas o dinheiro para o aluguel da lambreta teria que esperar. O sol saía pra esquentar um pouquinho. Eu ria ao tentar lembrar do sol do meu país. Das luzes quentes, nas madrugadas quentes. E uma lágrima de saudade escorria e eu corria e escrevia sobre estar ali, sobre querer um afago familiar, uma cervejinha no domingo à tarde, o som do carro bem alto e o vento levando e lavando minha alma.
Mas uma caminhada a Guadalupe eu não evitaria. Lugar lindo e cheio de histórias. Eu torcia pra lembrar de todas elas e contar na roda de amigos. Roda, quadrado, triângulos e tantos círculos. Dá até tontura lembrar. Dá cansaço só de lembrar das ladeiras que tenho andado. Mas a paisagem faz esquecer rapidinho. Só não esqueço daquele monte de ninhos de gaivotas. Nunca tinha visto tantas juntas.

Um estalo, um canto do galo, o sol na janela.

As paredes verdes, a velha estante de livros, o criado-mudo que mesmo pintei, as revistas espalhadas no chão, o skate do meu irmão, os recortes e pôsteres nas parede, os adesivos na janela, o baú cheio de lençóis, o rádio da vovó tocando ao longe, o ventilador rangendo, os primeiros espirros matinais, algumas pecinhas de Lego jogadas pelo chão, roupas penduradas atrás da porta, sapatos jogados em qualquer canto, algum brinquedo do meu irmão caçula, aquele trequinho de proteção que nunca sei o nome pendurado na janela e o vento balançando-o.
Depois de um tempo, você passa a perceber que dá pra estar em dois lugares ao mesmo tempo. O único problema é que se uma parte de mim está na Espanha, eu deveria me sentir mais leve e não o contrário. Mas talvez, por ser o contrário, por sentir esse peso, signifique o real laço que existe entre a gente. E não é nem pra ter um talvez nessa história. É isso sim. Acabei de sentir o fio amarrado no meu tornozelo e faltando alguns pedaços do meu peito.
E isso faz todo sentindo quando te abraço.





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Hey, Nathy, ~ ainda ~ não é seu aniversário. Mas cá está, umas palavras pra você, que fez de 2011 um ano cheio de sol e cerveja pra mim. E 2012 também, claro.
É bem assim que quero me sentir enquanto tu se encontras nas terras hispânicas.

Amo você, Oskar.

3 comentários:

Edgar Borges disse...

Lindo texto!

Nathy. disse...

o momento em que eu finalmente leio o texto e começo a chorar, na biblioteca pública de Cáceres.

Eu disse...

Me roubastes lágrimas, Ágda.